quinta-feira, 16 de junho de 2011

Mário de Sá-Carneiro - I




"INDÍCIOS DE OIRO"


Salomé


Insónia roxa. A luz a virgular-se em medo,
Luz morta de luar, mais Alma do que a lua...
Ela dança, ela range. A carne, álcool de nus,
Alastra-se para mim num espasmo de segredo...


Tudo é capricho ao seu redor, em sombras fátuas...
O aroma endoideceu, upou-se em cor, quebrou...
Tenho frio... Alabastro! A minha Alma parou...
E o seu corpo resvala a projectar estátuas...


Ela chama-me em Íris. Nimba-se a perder-me,
Golfa-me os seios nus, ecoa-me em quebranto...
Timbres, elmos, punhais... A doida quer morrer-me:


Mordoura-se a chorar – há sexos no seu pranto...
Ergo-me em som, oscilo, e parto, e vou arder-me
Na boca imperial que humanizou um Santo...




Último Soneto


Que rosas fugitivas foste ali!
Requeriam-te os tapetes e vieste...
Se me doí hoje o bem que me fizeste,
É justo, porque muito te devi.


Em que seda de afagos me envolvi
Quando entraste nas tardes que apareceste
Como fui de percal quando me deste
Tua boca a beijar, que remordi...


Pensei que fosse o meu o teu cansaço
Que seria entro nós um longo abraço
O tédio, que tão esbelta, te curvava...


E fugiste... Que importa? Se deixaste
A lembrança violeta que animaste,
Onde a minha saudade a Cor se trava?...




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